DA COMPRA E VENDA



·         É o negócio jurídico pelo qual um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa e o outro se obriga a pagar por ela certo preço em dinheiro (CC, art. 481).

·         Seu fim específico é a alienação de um bem.

·         Art. 1.245 do Código Civil que somente se transfere, entre vivos, a propriedade mediante registro do título translativo no Registro de Imóveis. Diz, ainda, o § 1º desse mesmo dispositivo que, enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

·         A compra e venda pode ter por objeto coisas ou direitos (neste caso, denomina-se cessão).

·         O contrato de compra e venda e de bens imóveis é bilateral e oneroso. Pode ser consensual ou real, comutativo ou aleatório, de execução imediata ou diferida.

·         É bilateral ou sinalagmático porque ambos os contratantes se obrigam reciprocamente: o vendedor, a entregar a coisa; o comprador, a pagar o preço.

·         É oneroso “pois que cada uma das partes faz uma prestação equivalente daquilo que recebe ou virá a receber da outra, sofrendo o patrimônio de cada uma o correspondente ônus ou sacrifício e havendo transferência recíproca de cousas ou direitos” (CUNHA GONÇALVES, 1956b, p. 290).

·         É, em geral, consensual, quando bastar o acordo de vontades sobre a coisa e o preço para se tornar perfeito, podendo, nesse caso, ser provado por qualquer meio admitido em Direito, salvo exceções previstas em lei (CC, art. 227). Mas, por vezes, exige a lei forma solene, como ocorre com a compra e venda de imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País. Nessa seara, a escritura pública é essencial à validade da compra e venda (CC, art. 108). Não observada esta forma pública, o negócio jurídico é nulo. Perceba que a escritura pública será exigida quando o valor do imóvel, e não o declarado pelos contratantes, for superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. Assim, ainda que se pretenda alienar parte do imóvel por valor inferior ao limite legal, a escritura pública é da substância do ato. Chama-se solene a compra e venda cuja perfeição dependa da observância de alguma solenidade, como a escritura pública.

·         Será comutativo quando houver certeza quanto às prestações. “Se à prestação do vendedor corresponde a do comprador, sem que qualquer das duas possa falhar, o contrato será comutativo, pouco importando que não se equivalham objetivamente” (GOMES, 2009, p. 266-267). Mas será aleatório quando for incerta a existência do imóvel objeto da compra e venda. Não só são aleatórios os contratos que se refiram a coisas futuras, cujo risco de não virem a existir (emptio spei) ou de virem a existir em qualquer quantidade (emptio rei speratae) um dos contratantes assuma (como no caso da compra de colheita futura), mas, também, aqueles que digam respeito a coisas existentes, contudo expostas a risco, assumido pelo adquirente (CC, art. 460). Parece improvável a celebração de compra e venda de bem imóvel futuro (emptio spei ou emptio rei speratae). Mas nada impede a compra e venda de imóvel existente, embora sujeito a risco, como uma enchente ou a desapropriação.

·         Será de execução imediata quando o cumprimento das obrigações se dá logo após a celebração da compra e venda e de execução diferida quando as obrigações tiverem de ser cumpridas em momento posterior à celebração do contrato.

·         Distingue-se da troca ou permuta porque, neste contrato, a contraprestação não é em dinheiro, mas em outro bem. Também não se confunde com a dação em pagamento. A datio in solutum, que é regida pelas normas da compra e venda (CC, art. 357), pressupõe obrigação anterior, enquanto a compra e venda “basta por si própria” (GOMES, 2009, p. 268).

·         Elementos essenciais: São três: coisa, preço e consentimento. “Quer-se significar com isso que está [o contrato] perfeito e acabado quando se verifica, quanto à coisa e ao preço, o consentimento” (GOMES, 2009, p. 272). Uma vez realizado o acordo o contrato está formado, sendo impossível, desde então, o arrependimento, que, se ocorrer, acarretará inadimplemento, com as consequências que dele derivam.

·         Coisa: A coisa que, aqui, nos interessa é o bem imóvel, que pode ser um terreno, uma casa, um apartamento, uma vaga de garagem, um jazigo (túmulo, sepultura).

·         Podem ser objeto de compra e venda todos os imóveis cuja alienação não seja proibida ou restringida por obstáculo legal, voluntário ou natural. A inalienabilidade das coisas resulta, principalmente, da lei, como se dá com os bens imóveis públicos. Decorre da vontade quando, na doação ou na disposição testamentária, o imóvel é gravado com cláusula de inalienabilidade. É, por fim, natural quando não pode ser separada do patrimônio do vendedor ou de outra coisa a que está indissoluvelmente ligada, como o usufruto (CC, art. 1.393) e a servidão.

·         Existem diversas regras determinando a indisponibilidade de bens, previstas, sobretudo, com o intuito de proteger credores. Confira:

a)    CTN, art. 185-A:
Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial.

§1º A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite.

§2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido.

b)    CPC, art. 752: Art. 752. Declarada a insolvência, o devedor perde o direito de administrar os seus bens e de dispor deles, até a liquidação total da massa.

c)    CF, art. 189: Art. 189. Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária receberão títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de dez anos.

d)    Lei n. 8.112, de 11/12/1990 (dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais)

e)    Lei n. 8.212, de 24/7/1991 (dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui o Plano de Custeio e dá outras providências): Art. 53. Na execução judicial da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, será facultado ao exequente indicar bens à penhora, a qual será efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor. §1º  Os bens penhorados nos termos deste artigo ficam desde logo indisponíveis.

·         Depende de autorização judicial a compra e venda de imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade. No caso de alienação dos bens clausulados, por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autorização judicial, o produto da venda converter-se-á em outros bens, sobre os quais incidirão as restrições apostas aos primeiros. É o que dispõe o parágrafo único do art. 1.911 do Código Civil, ao prever o que se chama de sub-rogação. Também se exige autorização judicial para a extinção ou sub-rogação do bem de família (CC, art. 1.719). Por fim, precisam de autorização judicial para serem alienados os bens do espólio. Diz o art. 992, inc. I, do CPC que incumbe ao inventariante, ouvidos os interessados e com autorização do juiz, alienar bens de qualquer espécie.

·         Para que o título referente à compra e venda seja registrado, deve o imóvel estar matriculado no cartório de Registro de Imóveis. A matrícula constitui exigência dos arts. 222 (“Em todas as escrituras e em todos os atos relativos a imóveis, bem como nas cartas de sentença e formais de partilha, o tabelião ou escrivão deve fazer referência à matrícula ou ao registro anterior, seu número e cartório”) e 223 da LRP (“Ficam sujeitas à obrigação, a que alude o artigo anterior, as partes que, por instrumento particular, celebrarem atos relativos a imóveis”).

·         Os arts. 222 e 223 da LRP exigem que, nos atos relativos a imóveis, seja feita referência à matrícula ou ao registro anterior. Não se trata, como poderia parecer, de uma faculdade. A menção ao registro anterior só será cabível nos casos de o imóvel, registrado sob a égide do Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939, ainda não estiver sido matriculado.

·         No sistema anterior à LRP, não havia matrícula. Os atos relativos a imóveis eram objeto de registro, por ordem cronológica, no livro que estivesse sendo utilizado no momento da prática do ato. Assim, era comum ter atos relativos a um imóvel espalhados por diversos livros, dificultando as buscas e prejudicando a segurança do registro. Esse sistema era chamado de pessoal, pois os livros eram organizados em razão das pessoas que participavam dos atos a serem registrados. As folhas dos livros eram escrituradas em razão das pessoas, daí ser também conhecido como sistema do fólio pessoal.

·         No sistema atual, chamado sistema do fólio real, os atos são praticados em função dos imóveis. Assim, para cada imóvel é aberta uma matrícula e, nela, são registrados ou averbados todos os atos relativos ao imóvel. Para saber a situação jurídica de um imóvel, basta abrir, em regra, um único livro, ao invés de vários, como no sistema anterior.

·         Preço: É a quantia que o comprador se obriga a pagar ao vendedor. Deve consistir em dinheiro. Se for outra coisa, o contrato passa a ser o de troca ou permuta. Não se exige, contudo, que seja exclusivamente em dinheiro. Será venda se a parte em dinheiro for superior; troca se for superior o valor da coisa. O preço deve ser sério, ou seja, deve consistir em soma que possa ser considerada contrapartida da coisa. Não se admite o preço irrisório, mas não se exige equivalência objetiva das prestações. Só não deve o preço ser tão insignificante a ponto de constituir liberalidade do vendedor. Deve ainda o preço ser certo. Mas isso não quer dizer que a sua exata determinação seja feita no momento da celebração do contrato. “Basta que possa ser determinado, como no caso de ser deixado à taxa de mercado” (GOMES, 2009, p. 275). A determinação do preço resulta, normalmente, da livre estipulação das partes. Mas pode ser que fique a arbítrio de terceiro, como um corretor ou avaliador de imóveis (CC, art. 485). O que não se admite é que a determinação do preço fique ao arbítrio de um dos contratantes. Nesse caso, a compra e venda será nula.

·         Capacidade e Legitimação: O contrato de compra e venda submete-se, em geral, às regras jurídicas sobre nulidade e anulabilidade. É nulo se praticado por pessoa absolutamente incapaz. É anulável se celebrado por pessoa relativamente incapaz. E, em se tratando de imóvel, não basta a representação ou assistência. Exige-se, além dessas medidas protetivas, autorização judicial. Não podem os pais alienar, ou gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do juiz (CC, art. 1.691). Os imóveis pertencentes aos menores sob tutela somente podem ser vendidos quando houver manifesta vantagem, mediante prévia avaliação judicial e aprovação do juiz (CC, art. 1.750), regra esta que, por força do art. 1.781 do Código Civil, aplica-se aos bens imóveis dos curatelados. O processo de alienação dos bens dos menores e dos interditos é de jurisdição voluntária, conforme prevê o inc. III do art. 1.112 do CPC.

·         Venda à Descendente: Diz a lei ser anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido (CC, art. 496). O intuito da lei é “evitar que, sob color de venda, se façam doações, prejudicando a igualdade das legítimas” (BEVILÁQUA, 1958, p. 243). O consentimento deve ser expresso e constará, sempre que se possa, do próprio instrumento de compra e venda. Caso seja dado em separado, deve observar a forma exigida para a compra e venda. O ato é anulável, e não nulo, como ocorria no sistema do Código Civil de 1916. Sendo anulável, convalida-se se o consentimento for dado posteriormente (CC, art. 176) e convalesce pelo decurso do tempo (CC, art. 179). O prazo para o exercício da pretensão anulatória é de dois anos, por aplicação subsidiária do art. 179 do Código Civil. Estabelece esse preceito normativo que, quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato. E, no caso, o art. 496 do Código Civil preceitua, expressamente, a anulabilidade da venda de ascendente a descendente, sem, contudo, mencionar o prazo para exercício da pretensão anulatória. Por se tratar de pretensão anulatória, o prazo é decadencial. Sobre o tema, o Enunciado n. 368, do Conselho da Justiça Federal, estabelece o seguinte: “O prazo para anular venda de ascendente para descendente é decadencial de dois anos” (art. 179 do Código Civil). Dispensa a lei o consentimento do cônjuge, mas não dos descendentes, se o regime de bens for o da separação obrigatória, que é o imposto nos casos previstos no art. 1.641 do Código Civil. Essa dispensa consta do parágrafo único do art. 496 do Código Civil, em redação que pode dar margem à dúvida. Isso porque tal dispositivo se refere a “ambos os casos”, quando, no caput do artigo, só se faz menção a um único caso, que é o da venda de ascendente a descendente. O Enunciado n. 177, do Conselho da Justiça Federal, solucionou a questão, ao prever que “Por erro de tramitação, que retirou a segunda hipótese de anulação de venda entre parentes (venda de descendente para ascendente), deve ser desconsiderada a expressão ‘em ambos os casos’, no parágrafo único do art. 496”.

·         Em alguns casos, como adiante será estudado, exige a lei outorga conjugal, que é a autorização de um dos cônjuges para a alienação de bens particulares do outro.

·         Obrigações do vendedor: o vendedor obriga-se não só a entregar o imóvel, mas também a assegurar ao comprador a efetividade do direito sobre a coisa que tiver alienado. Em suma, o vendedor responde pela evicção (CC, arts. 447 a 457) e pelos vícios redibitórios (CC, arts. 441 a 446).

·         Despesas: salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador (CC, art. 490).



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