O procedimento de reconhecimento de filiação socioafetiva, perante os
Ofícios do Registro Civil das Pessoas Naturais foi disciplinado pelo Conselho
Nacional de Justiça em 17 de novembro de 2017, por meio do Provimento 63, abordando
temas relevantes para os dias atuais.
O Provimento 63/2017 do CNJ possibilitou que o reconhecimento da
filiação socioafetiva seja efetivado diretamente nos cartórios do registo
civil de qualquer unidade federativa, uniformizando o seu procedimento.
Porém importante salientar que, após realizado o termo do Reconhecimento
da paternidade ou maternidade socioafetiva no Cartório de livre escolha, o
documento seja apresentado no Cartório detentor do assento de nascimento do ora
reconhecido, para que assim seja averbado a margem do respectivo assento o
reconhecimento do socioafetivo(a) e emitido uma certidão (2ª Via) com as
alterações devidas. Entretanto nota-se no provimento e debates sobre o tema uma
ausência na abordagem a esta segunda parte, que a meu ver é fundamental para a
real efetivação da pratica do ato.
O reconhecimento será ato de averbação e não de registro, razão pelo qual o Provimento ao exigir que
o requerente apresente, dentre outros documentos, a certidão de nascimento do
filho, subentende que o reconhecimento da filiação socioafetiva somente se dá
por ato de averbação, ou seja, posterior ao registro.
Todavia, é natural que surjam indagações e críticas que servem para
firmar interpretações sobre normatizações jurídicas recentes, bem como
aprimorar a nova ordem normativa, e assim refletirmos juntos sobre o procedimento
para o reconhecimento extrajudicial da filiação socioafetiva.
Entre as principais dúvidas encontradas nos deparamos com os requisitos
a serem observados para o reconhecimento, então façamos um check-list baseado
no referido provimento:
CHECK-LIST para reconhecimento extrajudicial
de filiação socioafetiva.
( ) I
- Requerimento firmado pelo ascendente
socioafetivo (nos termos do Anexo VI), testamento ou codicilo (artigo 11,
parágrafos 1º e 8º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) II
- Documento de identificação
com foto do requerente – original e cópia simples ou autenticada (artigo 11 do
Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) III
- Certidão de nascimento
atualizada do filho – original e cópia simples ou autenticada (artigo 11 do
Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) IV
– Anuência pessoalmente dos
pais biológicos, na hipótese do filho ser menor de 18 anos de idade (artigo 11,
parágrafos 3º e 5º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) V
– Anuência pessoalmente do
filho maior de 12 anos de idade (artigo 11, parágrafos 4º e 5º, do Provimento
63/2017 do CNJ);
( ) VI
- Não poderão ter a filiação
socioafetiva reconhecida os irmãos entre si nem os ascendentes (artigo 10,
parágrafo 3º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) VII
- Entre o requerente e o filho
deve haver uma diferença de pelo menos 16 anos de idade (artigo 10, parágrafo
3º, do Provimento 63/2017 do CNJ);
( ) VIII
- Comprovação da posse do
estado de filho (artigo 12 do Provimento 63/2017 do CNJ).
OBSERVAÇÃO: Referente o item VIII do Check-list acima,
citado no artigo 12 do Provimento
63/2017 do CNJ a orientação é que “suspeitando de fraude, falsidade, má-fé,
vício de vontade, simulação ou dúvida sobre a configuração do estado de posse
de filho, o registrador fundamentará a recusa, não praticará o ato e
encaminhará o pedido ao juiz competente nos termos da legislação local”.
Sendo assim, além do requisito da manifestação de vontade do requerente,
dos pais biológicos e do filho maior de 12 anos, existe determinação legal para
o oficial de registro de observar a configuração da posse de estado de filho
como condição indispensável à caracterização da filiação socioafetiva.
Em explicação ao supradito podemos analisar que a posse do estado de
filho corresponde à “relação de afeto,
íntimo e duradouro, exteriorizado e com reconhecimento social, entre homem e
uma criança, que se comportam e se tratam como pai e filho, exercitando os
direitos e assumem as obrigações que essa relação paterno-filial determina”.
Diante do exposto, o registrador deve estar atento à comprovação da
posse do estado de filho, evidenciando se há ou não elementos do tratamento que
caracterizam a filiação socioafetiva.
Devido a essa responsabilidade atribuída ao registrador é indicado que,
além dos documentos expressamente previstos no Provimento 63/2017 do CNJ,
exija, ainda, a apresentação dos seguintes documentos: I - certidão de
casamento ou instrumento de reconhecimento de união estável, referente ao provável
ascendente socioafetivo e a mãe ou pai biológico; II - declaração de duas
testemunhas, parentes ou não, que atestem conhecer o requerente e o filho,
reconhecendo entre eles a existência de um vinculo afetivo.
Agindo desta forma, o oficial de registro exerce sua atividade com cautelas
mínimas, porém garantidoras que o reconhecimento da filiação socioafetiva seja
realizado em conformidade com o ordenamento jurídico vigente.
Podemos questionar também o artigo 11, parágrafo 5º, do Provimento
63/2017 do CNJ, que estabelece “a coleta da anuência tanto do pai quanto da mãe
e do filho maior de doze anos deverá ser feita pessoalmente perante o
oficial de registro civil das pessoas naturais ou escrevente autorizado”. Do
qual grifo para chamar a atenção a obrigatoriedade do anuência “presencial”.
Outro ponto importante é de que a jurisprudência nacional já firmou o
entendimento de que é possível a coexistência da filiação biológica com a
socioafetiva, podendo constar dois pais e uma mãe ou duas mães e um pai, por
exemplo no registro de nascimento da criança.
A multiparentalidade reconhecida judicialmente, decorrente da
concomitância da filiação socioafetiva com a biológica, não é mais nenhuma
novidade. Todavia, o Provimento 63/2017 do CNJ trouxe relevante inovação ao
permitir o reconhecimento extrajudicial da filiação socioafetiva, sem exclusão
da biológica.
O Provimento 63/2017 do CNJ traz a tona “o fato de que a paternidade
socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento
do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos
jurídicos próprios (Supremo Tribunal Federal – RE 898.060/SC)”.
Nesse sentido, o artigo 11, parágrafo 3º, do Provimento 63/2017 do CNJ,
reza que “constarão do termo, além dos dados do requerente, os dados do campo
filiação e do filho que constam no registro, devendo o registrador colher a
assinatura do pai E da mãe do reconhecido, caso este seja menor”.
Deixando de lado qualquer dúvida sobre a questão, o artigo 14 do
Provimento 63/2017 do CNJ estabelece que “o reconhecimento da paternidade ou
maternidade socioafetiva somente poderá ser realizado de forma unilateral e não
implicará o registro de mais de dois pais ou de duas mães no campo filiação no
assento de nascimento”.
Desta maneira, após a edição do referido provimento, é possível que a
filiação socioafetiva seja reconhecida diretamente no cartório, sem que seja
afastada a filiação biológica, desde que haja anuência dos pais biológicos e do
filho maior de 12 anos, quando for o caso.
Por último, resta dizer que apesar do artigo 10, parágrafo 4º, do
Provimento 63/2017 do CNJ, exigir uma diferença mínima de idade de 16 anos,
entre o requerente e o filho a ser reconhecido, é provável que em determinadas
situações, através da via judicial, essa regra seja mitigada, a exemplo do que
já ocorre em casos de adoção, em que a jurisprudência tem flexibilizado o entendimento
acerca da idade mínima, priorizando o vínculo da filiação.
REFERÊNCIAS:
Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de
2017, 16h09
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